Current Date:fevereiro 9, 2025

Crítica: “Heartstopper” chega sem defeitos, fala da comunidade LGBTQIA+ e precisa de uma segunda temporada urgente

Esta matéria pode conter alguns spoilers caso você ainda não tenha assisto a serie

Caso você goste do mundo do entretenimento e esteve nas redes sociais desde a última sexta-feira, 22, sabe que aconteceu um dos lançamentos mais esperados do semestre: a série Heartstopper, inspirada nas histórias em quadrinho da autora Alice Oseman, que conta a história de Charlie Spring (Joe Locke)  e Nick Nelson (Kit Connor) (você pode saber mais aqui ).

Para início de conversa, não podemos negar que quando falamos em adaptações, seja em formato de série ou filme, nem sempre o que vai para tela acaba sendo o que estava no papel, mas com Heartstopper foi o contrário: a adaptação não apenas é extremamente fiel à história criada por Alice, como a sensação que dá ao assistir aos 8 episódios, de no máximo 30 minutos cada, é a de que elu criou este universo se baseando nos atores que interpretaram cada personagem. Como alguém que leu os quatro livros, posso afirmar que foi a adaptação mais fiel que assisti em muito tempo.

Vamos começar pelo começo. Oito episódios de, no máximo, 30 minutos cada. Para muitos isso pode soar como uma série não muito bem desenvolvida, afinal 30 minutos em muitos casos pode não ser tempo suficiente para que a história e os assuntos encontrados nela se desenvolvam bem e de forma clara. Mas, com Heartstopper não só toda a história é muito bem desenvolvida, como todos os assuntos são tratados de forma excepcional e os personagens recebem um tempo de tela que não deixa a desejar.

Um dos grandes pontos da série é a representação LGBTQIA+. Apesar de Charlie ser gay e as pessoas na escola saberem, Nick passa pelo processo da descoberta da bissexualidade ao longo dos episódios e de uma forma muito próxima da realidade de muitas pessoas, ao passar a se questionar, pesquisar sobre para entender melhor o que é a bissexualidade e se abrir para alguém com quem a pessoa tenha confiança. No caso de Nick, foi com o próprio Charlie, que teve uma recepção muito positiva e natural, sem questionar e/ou ficar com um pé atrás na relação, como é retratado em muitas séries e filmes.

Além dos dois, não podemos deixar de falar do casal Darcy Olsson (Kizzi Edgell) e Tara Jones (Corinna Brown), namoradas que se assumem através de um post no Instagram e vivem a questão das pessoas comentarem sobre, como se tivessem virado outras pessoas, mas que com a ajuda dos amigos a situação fica mais leve. E por último, mas não menos importante, Elle Argent. Interpretada pela famosa tiktoker trans Yasmin Finney, Elle também é trans e, diferente de muitas histórias que vemos por aí, a personagem não tem um enredo triste, muito pelo contrário. Sua questão na série acaba sendo a mudança de escola, já que em Heartstopper os alunos são separados entre o Colégio Truham só para garotos e o Colégio Harvey Greene, só para garotas. Mas em pouco tempo Elle cria um vínculo de amizade com Tara e Darcy, e aos poucos  perceber que talvez sinta algo além de amizade por Tao Xu (William Gao), amigo de Elle e Charlie.

Kizzi Edgell (Darcy Olsson), Corinna Brown (Tara Jones), Joe Locke (Charlie Spring), Kit Connor (Nick Nelson), Will Gao (Tao Xu) e Yasmin Finney (Elle Argent) em foto promocional da série. Reprodução: Netflix UK and Ireland

Muitos fãs da série, conhecendo a história antes da adaptação ou não, twittaram como tem se sentido representados por Heartstopper e pelos personagens, chegando até em mencionar o personagem de Kit Connor, na cena em que Nick conta para sua mãe Sarah, interpretada pela vencedora do Oscar, Olivia Colman, que se descobriu bi, que usaram desta cena para se assumirem para suas famílias.

Kit Connor, Joe Locke, Olivia Colman e Alice Oseman nos bastidores da série. Reprodução: Netflix UK and Ireland

Ainda falando sobre a série mostrar a realidade de muitas pessoas da comunidade, não podemos deixar de mencionar como não vemos os bullies tendo uma transformação mágica e no final virando amigos de quem eles maltratavam. Heartstopper mostra uma versão que é mais próxima da realidade, onde Ben Hope (Sebastian Croft) e Harry, os principais personagens bullies/homofóbicos não tem uma redenção e pagam o preço de suas ações. Muitas vezes, na vida real, uma pessoa que pratica bullying não necessariamente pede desculpas pelos atos e vira amigo da vítima, e a série trata deste assunto de uma forma leve porém mostrando a importância do assunto.

Outro ponto que a série faz questão de retratar é o lado que celebra a comunidade na adolescência, as duvidas, descobertas e todos os sentimentos e sensações que vem junto. Heartstopper é mais uma prova do porque o amor queer precisa ser mostrado nas telas e porque essa série é tão importante. E isso não se deve apenas à Alice e sua mente criativa, mas também à atuação do elenco que, como falado acima, são tão iguais a seus personagens, que deixam a adaptação ainda mais perfeita. A atuação de Kit Connor, Joe Locke, Will Gao, Yasmin Finney, Corinna Brown, Kizzy Edgell, Jenny Walser (Tori), Rhea Norwood (Imogen), Sebastian Croft e Tobie Donovan faz jus a cada personagem conhecido antes apenas no papel.

E claro que, como em toda adaptação, não podemos deixar de falar da direção impecável de Heartstopper, a fotografia perfeita, o roteiro que conta de fato com falas das histórias em quadrinhos, fazendo com que a série se torne ainda mais fiel, apesar de algumas cenas serem novas, uma caracterização que dispensa comentários, e sem falarmos nos cenários, que ajudam a dar o toque final na perfeição que é a série.

 

Quadrinho de Heartstopper e adaptação

Quadrinho de Heartstopper e adaptação

Quadrinho de Heartstopper e adaptação

Ah, algo essencial de mencionar são os efeitos gráficos que são mostrados em vários momentos, como borboletas e flores quando o personagens se beijam, folhas voando e até neve na cena em que Charlie e Nick estão brincando na neve no quintal do jogador de rúgbi do colégio. Além disso, a produção da Netflix com a See Saw Films também adiciona detalhes como uma “aura” colorida em volta dos personagens em alguns momentos, a batida de coração do casal principal quando eles se beijam pela primeira vez e divisórias em algumas cenas, típicas de histórias em quadrinhos.

Detalhes dos desenhos da série, o que a deixam mais fiel ainda aos livros

Um detalhe que mostra o carinho e atenção que foi colocado na criação da série são os títulos: cada um é de uma cor e sempre, de alguma forma, tem ligação com o cenário ou sentimento que envolve o episódio, como no intitulado “Bullying” onde a tela se “racha” e em “Secret” que o título se forma a partir de gotas de chuva, já que a cena se passa em um dia típico chuvoso em Londres. E eu não preciso nem falar da trilha sonora, não é mesmo? As músicas se encaixam de forma perfeita em cada cena e a série conta com a cantora Baby Queen que compôs a música Colours of You, vinda do ponto de vista de Nick, especialmente para a série.

Reprodução: Twitter

Heartstopper pode até ser uma série adolescente feita para adolescentes mas o poder dela é tão grande que pessoas de todos os cantos do mundo, até mesmo jornalistas em suas críticas, na casa dos seus 20/30 anos, tem compartilhado como a mais nova produção da Netflix com a See Saw Films teria sido importante e essencial para elus quando eram mais novxs. A parte mágica da série é que ela mostra a representação da forma que é na vida real, de forma natural. Ela passa a sensação de que estamos assistindo pessoas queer jovens se apaixonando, se descobrindo e sendo felizes.

Em sua semana de estreia, Heartstopper chegou a receber aclamações de mídias importantes e respeitadas como The Telegraph, que deu 5 estrelas de 5, 100% de aprovação pela mídia e público pelo Rotten Tomatoes e o selo de aprovação do site e debutou no Top 10 das séries mais vistas da Netflix em 64 países em oitavo lugar, além de ter sido a série mais comentada no Twitter nesse final de semana com mais de 929,000 menções. Tá bom ou vocês querem mais?

Alice Oseman (centro), criadore da série, com o elenco de Heartstopper

Enquanto esperamos ansiosamente por notícias de uma merecidíssima segunda temporada, vamos ficar vendo e revendo essa história leve, importante, romântica e divertida, adaptada das histórias em quadrinhos de Alice Oseman.